PERIPÉCIAS EM CHAVES – 3
Nas rotas do contrabando, há algumas histórias para recordar.
Aqui vai a terceira.
O açude era o caminho por excelência para darmos o salto e irmos até Espanha. Fica no Rio Tâmega e delimita a fronteira.
Visitei-o, na última vez que estive em Chaves. Está diferente, não tendo nada a ver com o que era naquele tempo. Agora tem um parque de merendas, um relvado enorme para prática desportiva, um parque infantil, esplanada, etc., nada a ver com aquilo que era.
Naquele tempo, no meio do açude havia umas pedras, género poldras, pintadas de branco, para “facilitar” a passagem de um lado para o outro.
Quantas vezes as pisei.
Estávamos prestes a começar o IAO. Daqui remeto a leitura do que isto significa para a descrição notável, feita em 11-12-2008, pelo Carlos Vardasca, no seu blogue (http://dotejoaorovuma-cabel.blogspot.com).
Já nos tinham avisado que aquilo era fome de matar. A comida vinha do quartel e, quando chegava, se chegasse, vinha fria e intragável.
Resolvemos, numa de defesa, ir fazer umas compras a Verin, entre outras coisas, de enlatados vários.
Como sempre, tratámos de arranjar boleia até à fronteira e cumprirmos a rotina habitual.
Desta vez fomos com um capitão, de que não me lembro o nome.
A trupe era constituída, pelo menos, por mim, pelo Vale Pereira e pelo Albuquerque Dias.
O tal Capitão deixou-nos perto dum campo de milho que nós já conhecíamos de aventuras anteriores e foi aí que ficámos de nos encontrar no regresso.
Atravessámos a fronteira de salto, ele apanhou-nos do outro lado e levou-nos até Verin, como era usual. O dia foi passando e, em Dezembro, a noite faz-se cedo. Quando demos por nós já o sol se tinha deitado.
Nada de transcendente dado que já conhecíamos as voltas a dar.
No regresso o Capitão deixou-nos em Feces de Abaixo, para nós passarmos de salto, para depois nos recolher no local combinado.
A primeira dificuldade foi acertarmos nas tais pedras pintadas de branco que, à noite, não se viam e não queríamos acender umas lanternas que tínhamos comprado, para não sermos surpreendidos.
Não houve outra solução senão esquecermos as pedras e atravessarmos a fronteira, com a água pelos joelhos, ou mais.
Do lado de cá toca a ir ao encontro do carro que nos levaria a Chaves.
O pior era dar com o sítio. Aquilo era logo ali, mas à noite, todos os gatos são pardos. Uns que era mais à esquerda, outros que era mais à direita…, até que resolvemos utilizar uma das lanternas, com os riscos daí inerentes.
Foco aceso para uma banda, foco aceso para outra e eis que se acendem os faróis de um carro.
Ali está ele, cochichámos nós, escondidos no milheiral!
Embora encharcados, corremos até ao carro e arrancámos. Ainda não tínhamos percorrido, nem sequer uns quinhentos metros, salta do escuro um guarda-fiscal, de pau de marmeleiro em punho, na direcção do pára-brisas. Depois outro e mais outro, estes de arma empunhada em riste.
Fomos apanhados.
Apontaram-nos uns lampiões para verem a nossa fuça e pediram-nos as identificações. Quem comandava o grupo era um sargento ou cabo da Guarda-Fiscal que, ao ver os nossos cartões de identidade, só dizia: - “Só me faltava esta, Só me faltava esta…”. “Isto assim, com oficiais é um problema”.
Pouco depois, mais calmos, já estávamos numa galhofa danada e, mais ainda, quando obrigámos o gajo a ver o grande contrabando que trazíamos, que mais não passava de umas latas de conserva e pouco mais, para o IAO. Isto parece que o deixou mais descansado.
Mas o tipo repetia-se e só dizia: - “Pareciam mesmo contrabandistas, com sinais de luzes e tudo”; “Só me faltava esta, Só me faltava esta.” Por fim lá nos deixou ir embora, ficando nós por saber se ele terá pensado que tinha apanhado, em flagrante, uma grande rede de contrabando.
Ao contar isto, hoje em dia, pode dar vontade de rir, mas, naquela tempo, por pouco não nos livrámos de ficar com o pára-brisas estilhaçado ou, quem sabe, de levar um tiro. Pelo menos, foi a única vez que fomos apanhados pela Guarda-Fiscal.
A.M. Camacho
Feliz Natal a todos.
Há 11 meses
Sem comentários:
Enviar um comentário